Segundo descobertas quentíssimas, o
exercício físico acende a produção de uma substância capaz de queimar
energia e afugentar problemas que aterrorizam o coração.
Nosso corpo possui tanto as células adiposas
brancas como as marrons. As primeiras estocam combustível, ou melhor,
gordura e, quando comemos demais, ficam infladas, deixando a barriga
saliente. Já o segundo time usa a gasolina armazenada no organismo só
para gerar calor, fato importante em seres vivos como nós, que
precisamos nos manter em uma mesma temperatura o tempo todo. A questão é
que os adultos apresentam muito mais unidades da versão guardadora de
excessos gordurosos do que da responsável por incendiá-las.
Contudo,
dá para mudar ao menos em parte esse cenário. Recentemente, cientistas
da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, descobriram um hormônio
fabricado durante a atividade física com potencial para transformar
aqueles depósitos esbranquiçados em indústrias consumidoras de energia.
"A substância, batizada de irisina, viaja do músculo até o tecido
adiposo e, lá, impulsiona essa maior queima calórica", explica Jun Wu,
bióloga e uma das autoras do trabalho (entenda os detalhes no infográfico abaixo).
Para
chegar à conclusão, ela e outros companheiros submeteram ratos a
treinos regulares. Então, verificaram que os animais bem condicionados
fisicamente tinham altos níveis de irisina e, acima disso, uma mudança
no funcionamento interno de boa parcela das células de gordura. "Embora
ainda faltem estudos na área, é impressionante que uma molécula
secretada por causa do exercício transforme unidades que antes
armazenavam triglicérides em outras que o utilizam apenas para produzir
calor. É uma contradição surpreendente", raciocina o fisiologista
William Festuccia, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade
de São Paulo.
Atenção: ao que tudo indica, o tal hormônio não
forma adipócitos escuros idênticos aos que temos naturalmente. "Na
verdade, surge um tecido bege, com metabolismo menos acelerado do que o
do marrom, porém muito mais ativo do que o do branco", esclarece o
endocrinologista Walmir Coutinho, da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia. Aliás, a título de curiosidade, a cor
menos clara vem da elevada concentração de ferro.
O potencial
benéfico da irisina vai além da perda de peso. Por dar um gás no
surgimento de adipócitos com atuação similar à dos marrons, o hormônio
inclusive jogaria um balde de água fria em inimigos do sistema
cardiovascular. Em uma revisão conduzida ao lado de pesquisadores
canadenses, William Festuccia destaca a importância dessas células
específicas no controle dos triglicérides, por exemplo. "Elas diminuem a
concentração dessa gordura no sangue por consumirem-na de forma a
produzir calor", arremata o fisiologista. Aí, o risco de uma artéria
entupir, estopim para infartos e derrames, cai.
Outro adversário
do peito, o diabete também é combatido pelas fábricas gordurosas de
energia. Segundo o levantamento de Festuccia, essas estruturas, quando
ativadas, usam glicose à beça para deixar sua maquinaria a todo vapor.
Assim, recrutam o açúcar que circula pelos vasos, regulando a glicemia.
"Sem contar que, por atacar a obesidade, a irisina afasta a resistência à
insulina, um fator fundamental para o aparecimento da doença",
complementa Páblius Braga, médico do esporte do Hospital Nove de Julho,
na capital paulista.
Uma substância com tantas possíveis
benesses sempre causa furor na indústria farmacêutica. O otimismo é
tanto que já há até quem especule que uma droga criada à base de irisina
será, no futuro, como um exercício físico completo em cápsulas. "Isso é
bastante improvável. Não se sabe, só para citar dois casos, se o
hormônio tem alguma influência direta em quadros de hipertensão ou
demências, males que a prática esportiva comprovadamente previne", deixa
claro a fisiologista Angelina Zanesco, da Unesp.
Existe uma dose ideal?
O
artigo de Harvard não se limitou a observar ratos. Após suarem a camisa
cinco vezes na semana por quase três meses, oito voluntários também
passaram a apresentar taxas extras de irisina - embora, nesse caso, os
cientistas não tenham averiguado se os efeitos da molécula eram
similares aos encontrados nos animais. "Infelizmente, hoje em dia não é
todo mundo que alcança esses índices de atividade física", lamenta
Angelina. Em outras palavras, não vale dar somente uma volta no parque
por mês. É necessário planejar uma rotina de treinamentos regulares e
contar com um pouco de paciência para as vantagens começarem a dar as
caras.
Os experts ainda desconhecem qual a intensidade perfeita
ou mesmo se as sessões de musculação promoveriam a propagação do
hormônio. "A falta de resposta para questões básicas é normal quando se
abre uma nova linha de pesquisa. Entretanto, essas perguntas devem ser
elucidadas nos próximos anos", enfatiza Jun Wu. Enquanto os
esclarecimentos não vêm, vale a máxima de ficar longe do sedentarismo,
mas respeitar seus limites a qualquer custo. Desse modo, você consegue
transformar diversas chateações em cinzas.
Uma promessa contra a obesidade
A
versão sintética da irisina deve começar a ser testada em voluntários a
partir de 2013. Em teoria, sua principal virtude é, diferentemente dos
medicamentos hoje disponíveis para contornar o excesso de peso, não
mexer com quaisquer mecanismos do cérebro. "Ainda é cedo demais para
falar qualquer coisa. Vários fármacos, e em especial os que aumentavam a
queima energética do corpo, trouxeram benefícios a animais, mas não
surtiram efeito em seres humanos", contrapõe Walmir Coutinho. Fora isso,
pouco se sabe sobre possíveis reações adversas. "Por estimular a
geração de calor, será que em doses elevadas a irisina provocaria uma
febre contínua?", questiona William Festuccia. Trata-se de uma grande
promessa para os próximos anos. E nada mais do que isso.
Fonte: Revista saúde - editora abril
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