A semente andina de uso milenar caiu nas
graças dos brasileiros por causa do efeito seca-barriga. Mas ela tem
talento para muito, muito mais...
Quando desembarcou no Brasil, há pouco
mais de um ano, a chia não demorou a entrar na lista de compras dos
interessados em perder peso. Nada mais compreensível. Como uma de suas
principais características é virar uma espécie de gel ao entrar em
contato com a água, ela dá uma baita saciedade, evitando ataques
desenfreados de gula ao longo do dia. Só que os benefícios do pequeno
grão - consumido por civilizações pré-colombianas há milhares de anos -
não ficam restritos ao emagrecimento. Pelo menos é o que a ciência tem
revelado.
Em estudo recente da Universidade de Queensland, na
Austrália, a semente mostra por que merece aplausos em outros âmbitos.
Em um primeiro momento, ratos foram alimentados com bastante gordura e
carboidrato. Depois, os cientistas acrescentaram chia na dieta deles
durante oito semanas. Ao final da intervenção, ficou claro que a
inclusão da semente melhorou a sensibilidade dos bichos à insulina.
"Isso significa que o hormônio foi mais eficiente na hora de encaminhar a
glicose aos tecidos, processo necessário para a geração de energia",
explica Lindsay Brown, uma das autoras da investigação. No caso dos
portadores de diabete, que ralam para manter o açúcar que passeia pelo
sangue em níveis adequados, o efeito é pra lá de bem-vindo, já que
representa um maior controle da doença.
O resultado também deve
ser encarado com empolgação por pessoas com sobrepeso. É que a maioria
já apresenta resistência à ação da insulina. "Daí sobem os riscos de
diabete e complicações cardiovasculares", conta a nutricionista Carolina
Chica, da Unidade de Doenças Cardiovasculares da Pontifícia
Universidade Católica do Chile. Tem mais: na pesquisa, a chia livrou o
fígado de adiposidade. "Esse quadro, conhecido como esteatose hepática,
pode culminar em danos permanentes no órgão", informa a nutricionista
chilena.
A enxurrada de benefícios parece ter um denominador
comum, que atende pelo nome de ácido alfalinolênico - ou ALA, para
simplificar. Trata-se de uma fração do ômega-3, gordura poli-insaturada
encontrada aos montes na chia. Seu trunfo: combater a inflamação
detectada no corpo devido à obesidade e que prejudica órgãos como
coração, fígado, cérebro... "Acontece que esse ácido graxo ajuda a
reduzir a produção de uma enzima chamada SCD1. Quando isso ocorre, há
menor liberação de substâncias inflamatórias no organismo", esclarece a
nutricionista Sandra Soares Melo, da Universidade do Vale do Itajaí
(Univali), em Santa Catarina.
Gordura na cintura? Perigo!
O
peso excedente, vale ressaltar, é um dos principais culpados pela
síndrome metabólica, que contribui para piripaques cardiovasculares, a
exemplo de infarto e derrame. "A tal síndrome é diagnosticada quando o
paciente apresenta concentração de gordura abdominal e pelo menos mais
dois fatores de risco, como glicose e triglicérides elevados, entre
outros", descreve a endocrinologista Cíntia Cercato, da Sociedade
Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, em São Paulo. Ainda bem que a
semente de chia, com seu ácido graxo anti-inflamatório, protege contra
todo esse chabu.
A comprovação vem da Universidade Nacional
Autônoma do México. Inicialmente, os cientistas pediram a voluntários
com aquele combo de problemas que deixassem de consumir 500 calorias no
seu dia a dia. Duas semanas depois, dividiram o pessoal em duas turmas.
Enquanto uma ingeriu uma bebida à base de proteína de soja, aveia e
chia, a outra recebeu uma mistura inócua. Em dois meses, todo mundo
apareceu no laboratório com a barriga mais enxuta. Mas só o grupo que
tomou o líquido com a semente viu fatores intimamente associados ao mal
perderem força. "O mais interessante é que as duas turmas emagreceram
igualmente, o que nos leva a concluir que a bebida foi, de fato, a
grande responsável pela melhora da síndrome", reflete Cíntia.
Aproveitando
que o assunto aqui gira em torno do coração, não dá para esquecer que o
ômega-3 da chia ainda favorece a redução da pressão arterial. "Na
prática, ele diminui a formação de tromboxano, uma molécula que estimula
o aperto dos vasos. Por outro lado, aumenta a síntese de
prostaciclinas, que são vasodilatadoras", ensina a nutricionista Anna
Carolina Di Creddo Alves, do Instituto do Coração, na capital paulista.
Sem falar que esse tipo gorduroso evita a oxidação do colesterol LDL,
processo que o torna um verdadeiro vilão para o peito - afinal, é nesse
formato que a molécula propicia o desenvolvimento de placas nas
artérias.
Não vá pensando que a semente é indicada só para quem
está com a saúde desajustada. Lá atrás, quando maias e astecas se
deliciavam com o alimento, a intenção era aperfeiçoar a resistência
física. Hoje, estudiosos da Universidade do Alabama, nos Estados Unidos,
sabem que a estratégia funciona. Por um período, antes de provas
longas, eles deram isotônico a seis atletas amadores. Depois, os
voluntários tomaram uma mistura desse líquido com uma bebida à base de
chia. Após cada intervenção, os rapazes correram por uma hora na esteira
e mais 10 quilômetros em uma trilha. Acabada o suadeira, a surpresa:
"Concluímos que o ômega-3 do grão melhora o rendimento dos atletas na
mesma medida que o carboidrato do isotônico", revela Travis Illian,
autor do projeto.
Para o cientista, a principal vantagem da
descoberta é oferecer aos esportistas um substituto à altura para os
tradicionais isotônicos, cheios de açúcar. Mas, se você não pretende
participar de uma maratona, uma boa pedida é usar a farinha ou grão de
chia duas horas depois dos exercícios. Assim, dá para aproveitar as
fibras solúveis que a semente esbanja. "Essas substâncias retêm água, o
que prolonga a hidratação e a presença de minerais no organismo",
explica a nutricionista Paula Crook, da PB Consultoria em Nutrição, em
São Paulo.
Foi justamente nessas versões, ou seja, semente e
farinha, que a nutricionista Sandra Soares Melo, da Univali, levou o
alimento andino para o laboratório. O objetivo era comparar a ação de
ambas as variedades em temperatura ambiente e aquecidas. "Vimos que, por
causa das fibras, todos os tratamentos estimularam o trânsito
intestinal nos animais analisados", conta.
Contudo, quando a
pesquisadora e seus alunos avaliaram o estresse oxidativo - fator
relacionado a doenças como diabete e câncer -, ficou evidente que ele só
foi amenizado quando as cobaias ingeriram o farelo que não passou pelo
fogo. "Ele não apresenta gordura como a semente. E a substância é a
principal a sofrer oxidação. Esse processo também é facilitado quando a
temperatura está elevada", justifica Sandra. Logo, se a ideia é barrar o
estresse oxidativo, já sabe: a farinha ao natural é a melhor opção.
Agora,
se estiver de olho em uma ação mais global a favor do funcionamento do
corpo, as sementes saem na frente. Basta consumir duas colheres de sopa
todos os dias. Só duas mesmo. "Como a chia tem muitas fibras, pode
dificultar a absorção de alguns minerais, além de desregular o intestino
se não houver consumo adequado de água", frisa o nutricionista José
Aroldo, diretor da Nutmed, no Rio de Janeiro. Seguindo essa
recomendação, certamente você terá tantos motivos quanto as civilizações
antigas para idolatrar a semente de chia.
Se a intenção é perder peso...
Seu
principal objetivo com a chia é mesmo afinar a cintura? Então faça o
seguinte: deixe a semente na água por pelo menos 40 minutos. Quando a
mistura se transformar em um gel, adicione suco de uva sem açúcar para
obter uma espécie de sagu. "Consuma no café da manhã ou no lanche do
final da tarde. Dessa maneira, você evita abusos nas principais
refeições do dia", aconselha a nutricionista funcional Vanderlí
Marchiori, de São Paulo.
Fonte: Revista saúde - Editora Abril
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